No Dia Mundial de Combate ao Câncer, Alô Alô Bahia entrevista a médica Clarissa Mathias, referência em oncologia

O 8 de abril marca o Dia Mundial de Combate ao Câncer, data instituída pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para incentivar as pessoas em todo o mundo a promoverem a prevenção da doença, a segunda que mais mata no mundo.

De acordo com o Instituto Nacional do Câncer, no Brasil, em 2021 ocorrerão 625 mil casos novos da doença (450 mil, excluindo os casos de câncer de pele não melanoma). O câncer de pele não melanoma será o mais incidente (177 mil), seguido pelos cânceres de mama e próstata (66 mil cada), cólon e reto (41 mil), pulmão (30 mil) e estômago (21 mil). O câncer de pele não melanoma representará 27,1% de todos os casos de câncer em homens e 29,5% em mulheres.

Para falar sobre o tema, conversamos com Clarissa Mathias, médica há 20 anos do NOB/Oncoclinicas/Hospital Santa Izabel, diretora da Associação Internacional para o Estudo do Câncer de Pulmão e presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) e do Comitê de assuntos internacionais da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO). Formada pela Universidade Federal da Bahia em 1991, a especialista fez residência na Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, e é referência na área.

Alô Alô Bahia: Estamos falando de uma especialidade que além de razoavelmente nova dentro da medicina. O quanto ainda temos a descobrir sobre o câncer?

Clarissa Mathias: As grandes conquistas em relação ao tratamento do câncer passam pelo entendimento da gênese da doença, tais como fatores genéticos e moleculares, além de fatores ambientais. Através destas descobertas, novos tratamentos como terapias alvo dirigidos e imunoterapia tornaram-se possíveis.

 Estamos perto da tão sonhada cura?

A cura do câncer inicial acontece em muitos tipos da doença, até mesmo agressivos como pulmão e pâncreas, caso o mesmo seja descoberto inicialmente e seja passível a procedimentos cirúrgicos, seguidos, quando necessário, por quimioterapia e, eventualmente, radioterapia. A cura do câncer avançado e, mais ainda, o controle a longo prazo da doença, é uma realidade para muitos pacientes portadores de tipos agressivos através da utilização de terapias alvo e imunoterapia.

 Segundo a OMS, até 2025 o câncer deve assumir a liderança no ranking de doenças que mais matam em todo o mundo. Qual é o maior desafio que vem se impondo mais recentemente, já que o aumento da longevidade implica no aumento de doenças crônicas, entre elas o câncer?

O maior desafio no controle do câncer é adoção de medidas de prevenção e o diagnóstico precoce dos pacientes com a incorporação rotineira e abrangente de exames de rastreamento, tais como tomografias de tórax para fumantes para o rastreamento do câncer de pulmão, mamografias, colonoscopias e exames ginecológicos.

 O câncer pode ainda não ter uma cura definitiva, mas já se sabe que um terço das mortes se devem a questões comportamentais e alimentares, como o alto índice de massa corporal, baixo consumo de frutas e vegetais, falta de atividade física e uso de álcool e tabaco. Sendo assim, qual a importância de se educar desde cedo as pessoas para tenham uma vida mais saudável e consciente?

Cerca de 30% dos casos de câncer podem ser evitados através de mudanças comportamentais, como controle de peso, consumo de refrigerantes e embutidos e uso de cigarro. Estes hábitos saudáveis devem ser aprendidos na infância porque, inclusive, existem estudos mostrando que a obesidade na infância é um fator de risco importante para o desenvolvimento do câncer. O uso do álcool também está relacionado à vários tipos de câncer, inclusive é sabidamente um dos principais fatores de risco para câncer de mama.

 Estatísticas provam que mulheres cuidam mais da saúde do que os homens. O que é possível fazer para que haja um equilíbrio nesse aspecto?

Precisamos aumentar a conscientização dos homens em relação à importância dos exames de prevenção e da detecção precoce. Campanhas como o Novembro Azul trazem a discussão deste tema anualmente e devemos carregá-los para todos os meses.

 Quanto a genética influencia no desenvolvimento de um câncer?

Sabemos que fatores genéticos são responsáveis por cerca de 10% dos casos de câncer, ou seja, apenas 10% dos casos de câncer podem ser atribuídos a estes fatores. Atualmente, vários genes podem ser identificados, tais como BRACA 1 e 2, PALB e outros e a descoberta destes genes pode mudar a história de muitas famílias. A avaliação deve ser realizada por um Oncogeneticista que, após observar a história pessoal e familiar do paciente, pode solicitar o estudo genético.

 Houve uma redução significativa no rastreamento da doença, tratamento e cirurgias para combater o câncer com a pandemia do coronavírus. Já é possível prever o tamanho do dano?

Ainda não conseguimos prever o tamanho do dano mas acredito que o mesmo é bastante preocupante e, infelizmente, depois de um ano de pandemia, já estamos recebendo pacientes com doenças em estágios avançados que ignoraram sintomas e sinais desenvolvidos no período.

 Pesquisas de diversas entidades e sociedades médicas, inclusive a SBOC, indicaram que houve uma queda preocupante durante a pandemia na busca por exames periódicos de controle, essencial para o diagnóstico precoce do câncer. De que forma isso irá impactar a curto e médio os índices de controle dos tumores?

Este é um ponto extrema de importância e preocupação porque o número de exames de rastreamento caiu drasticamente e o impacto a longo e médio prazo, com certeza, será o aumento exponencial, que já está sendo sentido nos consultórios e hospitais, um ano depois da pandemia, de casos avançados e incuráveis. Ainda não conseguimos dimensionar, em termos numéricos, qual a extensão deste número.

 Você é bastante ativa nas redes sociais, participa de lives e vídeos no Youtube sempre levando informação ao público, como estamos fazendo aqui agora. Como essa estratégia tem ajudado na prevenção e combate ao câncer?

Acredito muito no poder da educação e do conhecimento como forma de melhoria no cuidado pessoal, na realização de exames de rastreamento, no reconhecimento de sintomas, na atenção ao próprio corpo, por isso, sempre me disponibilizo a ser veículo nestas ações.

 Você é uma defensora dos tratamentos multidisciplinares e, também, do exercício humanizado da Medicina. Fale um pouco sobre isso.

Acredito muito no Cuidado Integral do paciente por uma Equipe Multidisciplinar, envolvendo médicos, enfermeiros, farmacêuticos, nutricionistas, psicólogos, fisioterapeutas, porque cada um consegue agregar uma visão humanizada e plena. O paciente e a família precisam se sentir acolhidos em um momento tão difícil da sua vida, carregado por medos e incertezas. O exercício humanizado da Medicina é dever de todos os médicos porque o paciente precisa ser tratado com carinho, competência, com um olhar diferenciado e cuidadoso.

 

Foto: Divulgação. Siga o insta @sitealoalobahia.

 

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