Ginecologista baiana fala sobre problema de Anitta e desconhecimento do corpo feminino

Além de levar a música brasileira para todo o mundo, Anitta se tornou um símbolo de mulher forte e independente que não vê problema algum em falar sobre certos tabus sociais que envolvem os corpos e a sexualidade feminina.

 

Recentemente ela divulgou em suas redes sociais um problema de saúde, endometriose, que levou anos para ser diagnosticado da forma correta pelo simples fato de que a saúde da mulher e os incômodas que elas possam sentir durante as relações sexuais não são levados à sério, inclusive por muitos profissionais de saúde.

 

Em entrevista exclusiva à repórter Paloma Guedes, a ginecologista baiana Ludmila Andrade, falou sobre a gravidade de não se falar abertamente sobre o corpo feminino.
 

Recentemente a cantora Anitta falou abertamente sobre sérios problemas com diagnósticos errados que ela sofreu até que sua endometriose, que precisará de cirurgia, fosse finalmente diagnosticada. Você acredita que ainda hoje, com a evolução da medicina e até mesmo do feminismo, a saúde íntima feminina é subjugada? As dores das mulheres são vistas como “normais”?

 

Me espanta absurdamente perceber que apesar do acesso aos serviços de saúde ainda há um subdiagnóstico de endometriose nessas pacientes. Eu já percebi mulheres que na consulta não sabiam que a dor que elas sentiam durante o período menstrual era algo patológico e que precisava ser tratado, que o incômodo que elas tinham na relação sexual era algo patológico e que precisava ser tratado. As próprias mulheres por falta de orientação e por conta dessa sociedade que leva uma sobrecarga tão absurda às mulheres faz com que elas simplesmente ignorem o próprio corpo. Um segundo ponto que é extremamente importante também é que os profissionais de saúde não estão adequadamente preparados para orientar e escutar essas mulheres. Na área de saúde a escuta é algo muito importante, então quando um paciente chega no consultório com uma demanda, a gente precisa acolher aquela demanda, escutar e valorizar o que está sendo dito. 
 

 

Porque as mulheres têm tanta vergonha de seus corpos?

 

Eu acho que a resposta para essa pergunta é bem complexa e multifatorial, mas que na verdade termina em um único ponto: a cobrança absurda sobre os corpos femininos para agradar a um padrão de beleza estabelecido e determinado pela mente masculina. Esse nível absurdo de exigência sobre os corpos foi fazendo com que as mulheres tivessem vergonha dos seus corpos por comparação. E a gente se compara o tempo inteiro. E se a gente não encontra uma representatividade de belo no nosso formato de ser a gente sempre vai achar que nosso formato é ruim e vai achar que o outro é melhor.

 

Como saber o que é normal ou não em termos de saúde e higiene íntima das mulheres? Supondo que, infelizmente no Brasil, muitas meninas não encontram em casa esse tipo de educação que não é apenas sexual, porque suas mães também não tiveram acesso a isso. Onde achar essa informação?

 

Educação sexual não quer dizer ensinar a pessoa a fazer sexo. Educação sexual significa orientar as pessoas a tudo o que diz respeito à sua saúde sexual. As pessoas têm o hábito de achar que a genitália é uma coisa suja, que é algo que não pode ser tocado por si próprio, ser manipulado, e isso gera uma ignorância muito grande sobre o próprio corpo. As mulheres anulam a existência do órgão genital como se aquilo ali fosse proibido e isso gera muito desconhecimento. Saúde e educação sexual, se fosse oferecido de qualidade nas escolas desde a educação infantil, particularizando, obviamente como qualquer conteúdo escolar para a idade de cada um, tenho certeza que teríamos uma redução muito grande dos problemas sexuais e dos problemas de saúde já que as pessoas teriam um acesso fácil a essas informações.

 

Você consegue perceber mudanças na forma dos parceiros tratarem as mulheres que vão até seu consultório, com um respeito ou pelo menos uma tentativa maior de entendimento sobre a explosão hormonal e física pela qual passamos todos os meses?

 

Com a internet, o acesso à informação permitiu que ocorresse uma mudança na forma das pessoas se enxergarem, pro bem e pro mal. E os jovens, os meninos por volta dos 20, 30 anos de idade tiveram um acesso maior à informações que permitam a eles compreenderem melhor as alterações hormonais e comportamentais das mulheres. Já na população com um pouco mais de idade isso é mais difícil: com 50 anos, 45, os homens não têm uma visão tão aberta quanto os jovens adultos de hoje.

 

Quais são as disfunções sexuais mais comum que as mulheres tomam para si e que não necessariamente dependem apenas delas e sim da relação com o parceiro?

Essa é uma questão difícil de responder porque depende de uma conjuntura de fatores que dependem do ambiente do individual e da parceria. Normalmente as disfunções sexuais estão atreladas à falta de conhecimento do próprio corpo e uma associação de fatores como cansaço, tripla jornada de trabalho, desgaste, falta de diálogo… por exemplo, relações muito longas às vezes colocam o sexo apenas como uma situação mecânica de obrigação e isso faz com que o desejo sexual seja minado.

Confira a entrevista que Anitta deu ao "Fantástico", no último domingo (10/07): 
 

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