16 Jun 2015
Nofies: a classe A voltou para a toca

“Durante a curta era de milagre econômico do primeiro mandato de Lula, os lances da ascensão da famosa “nova classe C” só rivalizaram com o boom da nova classe A, novos-ricos desfilando em seus carros possantes, cintos de fivelas com logos douradas e festas espetaculares. Parecia sepultada para sempre a velha culpa tropical de ser rico, que mantinha a elite encastelada num clube fechado ao qual só tinham acesso, de vez em quando, as colunas sociais. A cereja do bolo foi a febre das redes sociais, em que empresários e banqueiros do “milagre” mostraram sua cara, seus barcos em Angra, suas selfies em viagens de vinho pela Toscana, suas dancinhas nas boates de Ibiza e Saint-Tropez com muitos arrobas e hashtags. Alguns deles – remember Eike Batista – criaram contas no Twitter para dar a receita do sucesso, que acabavam virando livro, inaugurando o filão das obras de autoajuda para os negócios, tão comum nos States, paraíso dos self-made men.
A realidade, como se sabe, hoje é outra. Um naco da classe C acabou caindo de novo da pirâmide, os cintos apertaram com os péssimos indicadores da economia, a bola do Brasil nos fóruns mundiais murchou e a classe A voltou para a toca, criando uma nova turma: a dos novos pobres, que também existe nas melhores capitais do mundo.
Não que eles estejam pobres, longe disso, mas a festa acabou. Existe até um termo criado no high londrino para definir os órfãos dos anos dourados: “nofies”, uma abreviação para “no selfies”, ou seja, ricos que sumiram do Instagram e do Facebook para poder curtir sua vida off-line em paz – e longe do fisco.
Os nofies não circulam em boates, trocaram as férias na badalada Côte d’Azur por uma praia deserta na costa da Córsega, pedem que os garçons levem seus vinhos caríssimos, de preferência, à mesa direto no copo (afinal, não pega bem ostentar o rótulo), aboliram as grifes berrantes de sempre por um cardigã de uma loja sem marca de Londres e correm dos hotéis estrelados aonde todo mundo vai, preferindo um Sofitel honesto a ser flagrado fazendo check-out num palácio de mil e uma noites.
Não falam de política (vai que tem alguém gravando), trocaram suas máquinas possantes por um jipe usado, não são vistos mais em Miami, que virou um bairro de São Paulo, nem pisam numa feira de arte – seus marchands resolvem as compras via catálogo e secretária. A contenção de gastos e aparições também se estenderam às suas mulheres, que foram terminantemente proibidas de circular por aí com suas bolsinhas de crocodilo – mas as amantes, ok, já que quase ninguém sabe quem elas são, ó vida injusta. Todo mundo sabe o alto cacife de um nofie, mas, como ele precisa pregar na empresa que estão numa época de ajuste e corte de verbas, o exemplo tem que partir dele.
Mas a regra número 1 é: em nome da privacidade, os nofies riscaram, definitivamente, da agenda de contatos os amigos que têm Instagram ou que colocam o celular sobre a mesa de jantar, perigo dos perigos. E, para não caírem na tentação, não estão nem aí para o smartphone da vez ou para o Apple Watch, um convite ao grampo. Não por acaso, a venda daqueles celulares mais simples de antigamente, de capa flip-flop, sem e-mail ou WhatsApp, voltou a subir. Eles são os gadgets do momento.
Os nofies voltaram a ser como os milionários de antigamente, que andavam mal ajambrados e que ninguém diria quem eram eles. Os ricos de verdade de hoje querem estar fora do Google, dos chats e da lista do HSBC da Suíça. Quem diria que, num mundo altamente tecnológico e virtual, está na moda quem tem a vida mais analógica possível.”
Foto: Reprodução/Mauricio Planel.