Num futuro distante, um vírus se espalha pela população de Salvador, causando ódio e conflitos entre as pessoas. Enquanto as autoridades tentam lidar com um problema, os moradores evocam uma antiga lenda de um super-herói capoeirista, que aparece para salvar a cidade.
Toda essa história é contada no cordel “A Lenda do Badauê”, criado pelo ilustrador soteropolitano Eddy Azuos (@eddyazuos). O ilustrador conta que o personagem já existia no seu imaginário desde a infância, quando começou a praticar a capoeira. A ideia do folheto tomou forma no ano passado, após ele participar de um curso de história do cordel brasileiro.
“O professor me estimulou a escrever uns versos em cordel. Quando eu mostrei, ele achou bacana e me disse que eu poderia explorar a ideia do herói capoeirista com as minhas ilustrações. Com isso, eu decidi unir esses elementos para criar o folheto”, diz.
O herói utiliza um dobrão [instrumento usado nas rodas de capoeira] para evocar elementos da natureza que o ajudem em combate. O personagem é inspirado em diversos elementos da luta e em capoeiristas como o mestre Moa do Katendê, morto em 2018.
“Eu me senti muito tocado pelo ocorrido com o mestre Moa e trouxe diversos elementos que remetessem a ele na construção do personagem como a boina, o tom da pele, a barba, a calça de capoeira. Eu sempre o via nas fotos com uma sacolinha de lado e decidi que o personagem também carregaria uma sacola, que é de onde ele tira o dobrão”, fala.
Voltado para o público infanto-juvenil, o folheto conta com 24 páginas e foi construído em cerca de três meses. Para lançar a versão física, Eddy lançou uma vaquinha para ajudar no custeio das impressões. Até o momento, o financiamento alcançou a meta inicial de R$ 2000, resultando em 1000 exemplares, que serão distribuídos em escolas públicas, ONGs e projetos sociais do Subúrbio Ferroviário, onde o artista nasceu.
“A minha ideia é que os professores possam desenvolver atividades com os alunos. Eu acho que pode ser muito positivo para as crianças terem uma história com a qual elas se identifiquem e se vejam ali dentro. Quando eu era criança, não via a cor da minha família, nem dos meus amigos nos desenhos que eu gostava e ficava muito frustrado com isso”, conta.
Essa frustração em não se ver na TV se traduzia em alguns momentos de sua infância, como uma conversa que teve com sua mãe, enquanto caminhava pelo bairro de Paripe. “Eu vi uma pessoa com vitiligo e perguntei a ela o que era. Ela não soube explicar e disse que se eu comesse doce e bebesse água, ficaria com aquela doença. Quando ela saía, eu pegava um pote de açúcar e comia com água para tentar ficar branco igual aos personagens dos desenhos que eu vi. Eu demorei para entender que aquilo era resultado de uma estrutura racista que apagava o negro de algumas obras”, recorda.
“Eu quero que os meninos de hoje tenham contato com obras que os motivem, façam com que elas se enxerguem, se olhem com mais alegria no espelho e passem a gostar mais de si mesmos e ter orgulho em ser pretos”, finaliza.
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