Atender ligações telefônicas não faz parte da rotina de boa parte da Geração Z. Uma pesquisa da plataforma britânica Uswitch, que ouviu 2 mil pessoas, revela que 1 em cada 4 jovens entre 18 e 34 anos nunca atende o telefone. O levantamento aponta ainda que 70% preferem mensagens de texto e 56% associam ligações inesperadas a más notícias.
A mudança de comportamento já é sentida no ambiente corporativo. Se antes a comunicação profissional era baseada em chamadas, hoje jovens profissionais priorizam mensagens escritas, e-mails e plataformas como Slack e Teams, criando um choque geracional dentro das empresas.
“É uma geração que nasceu imersa no digital. Eles buscam agilidade, eficiência e autonomia, e as mensagens permitem conexão sem interromper o fluxo do trabalho, como acontece com as ligações”, explica Aimée Rocha, gerente de aquisição e gestão de talentos do Grupo L’Oréal, que lidera programas voltados à Geração Z.
Desconforto com a imprevisibilidade
Para especialistas, o incômodo com chamadas está ligado à imprevisibilidade e à exigência de respostas imediatas. “Uma ligação pode soar invasiva quando a mesma conversa poderia acontecer por mensagem, com tempo para refletir”, analisa Aline Riccio, vice-presidente da consultoria Korn Ferry para a América do Sul.
A consultora de RH Letícia Pavim, cofundadora da Rede Pavim, que capacita líderes de grandes empresas, confirma a percepção. “Há muitas reclamações de líderes sobre a comunicação dos jovens”, afirma. Ela própria, integrante da Geração Z, admite evitar chamadas: “Não gosto de ligação. Deixo o celular no ‘não perturbe’ há anos”.
Impactos na cultura e nos resultados
Embora pareça apenas uma mudança de hábito, a preferência por mensagens já gera impactos na dinâmica das empresas. “A comunicação escrita abre espaço para interpretações e pode atrasar decisões”, pontua Pavim. Segundo ela, tarefas se alongam, combinados ficam incompletos e expectativas deixam de ser alinhadas.
Além disso, habilidades que exigem interação em tempo real — como negociação, resolução de conflitos e feedbacks sensíveis — podem ser prejudicadas. “Evitar totalmente a comunicação por voz limita o desenvolvimento dessas competências, que são fundamentais para quem vai liderar”, avalia Riccio.
O reflexo também chega aos negócios. “Quando tudo vira e-mail, respostas demoram dias. Negociações travam”, diz Pavim. “Contratos e parcerias dependem de confiança. Um atendimento frio e distante facilita a troca por outra empresa.”
Equilíbrio em ambientes multigeracionais
Para especialistas, o caminho passa por acordos claros e flexibilidade em ambientes com profissionais de diferentes gerações. “É importante conversar sobre preferências: quando usar mensagem e quando a ligação é necessária”, sugere Pavim.
Rocha reforça que os estereótipos nem sempre se confirmam. “A Geração Z não é silenciosa. É extremamente comunicativa, criativa e conectada — apenas se expressa de outras formas.”
A solução está no equilíbrio. “A ligação é só mais uma ferramenta”, resume Riccio. “Cada situação pede um canal diferente.” Práticas simples, como avisar antes de ligar, definir protocolos de comunicação e criar momentos fixos de alinhamento, ajudam a reduzir conflitos e melhorar resultados.