O fotógrafo brasileiro Gui Christ foi eleito o melhor retratista do ano por um dos principais prêmios de fotografia do mundo. O anúncio foi feito na quarta-feira (16), e o artista, que vive em São Paulo, celebrou a conquista com uma homenagem a Ogun, orixá cultuado nas religiões de matriz africana. “Ogunhe! Toda vitória pertence a Ogun, pertence a todos os terreiros do Brasil”, escreveu em uma rede social, diretamente de Londres.
A vitória tem relação direta com sua fé. Praticante da Umbanda, Gui desenvolveu o projeto “M’kumba”, que aborda o racismo religioso e a resistência das religiões de matriz africana no Brasil. Segundo o fotógrafo, a ideia surgiu durante o início de sua formação sacerdotal na Umbanda e foi impulsionada por experiências pessoais e pela leitura do livro Intolerância Religiosa, de Sidnei Nogueira.
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Foto: Gui Christ/2025 Sony World Photography Awards
“Macumba é uma palavra de origem Congo-Angola que significa ‘encontro de sábios’, ou ‘encontro dos senhores das palavras’”, explica Gui em entrevista ao g1. “Esses encontros eram momentos para cultuar ancestrais, tanto os que ficaram na África quanto os que surgiram aqui no Brasil. Mas, sob a ótica colonial e racista, passaram a ser vistos como práticas demoníacas ou ameaças de insurreição.”
Nascido em Niterói, no Rio de Janeiro, Gui Christ tem 45 anos e vive na capital paulista há 11 anos. É fotógrafo documental há 15 anos, com foco em populações e territórios periféricos. Ao longo da carreira, já produziu reportagens sobre ocupações urbanas e comunidades em situação de vulnerabilidade. Seu trabalho busca retratar essas realidades a partir da perspectiva dos próprios moradores, em contraponto ao olhar hegemônico.
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Foto: Gui Christ/2025 Sony World Photography Awards
O fotógrafo relata que sofreu um episódio marcante de racismo religioso, apesar de ser branco. Anos atrás, enquanto caminhava por uma calçada usando roupas e colares tradicionais da Umbanda, foi alvo de um ataque: um motorista jogou o carro em sua direção. “Eu tive que me jogar no chão para não ser atropelado. O carro seguiu sem prestar socorro. No vidro traseiro, havia um adesivo com referência a Jesus. Foi quando percebi o quanto o racismo religioso está presente no nosso cotidiano, mesmo para quem, como eu, nunca havia sentido isso antes na pele”, contou.
A experiência reforçou sua percepção sobre o papel da fotografia como instrumento de denúncia e conscientização. “Aqui no Brasil, muita gente ainda não entende o que é o racismo religioso. Acha que se resume à depredação de terreiros. Mas ele está nas pequenas violências do dia a dia, tão normalizadas que passam despercebidas.”