Em meio à diversidade cultural de Toronto, encontramos um pedacinho da Bahia. Para além dos soteropolitanos que vivem em solo canadense, a primeira capital do Brasil está presente através da sua característica e cobiçada culinária.
Na terra do poutine, o acarajé tem conquistado espaço na rotina gastronômica dos saudosos baianos e curiosos nativos e imigrantes de outras nações, que ousam se aventurar nas delícias do dendê.
Natural de Salvador, a cozinheira Nilza de Sousa começou a sua história com o Canadá em 2010, através do intercâmbio das filhas na cidade de Vancouver. Após o casamento de uma delas com um canadense, Nilza passou a visitar o país com frequência e, desde 2020, reside por aqui.
Filha de uma baiana de acarajé que comercializava os quitutes no Porto da Barra, um dos principais pontos turísticos de Salvador, Nilza desde muito cedo aprendeu a preparar pratos típicos. Em Toronto, voltou a cozinhar para atender pedidos de amigos e familiares que sentiam saudade do tempero da Bahia. “O pessoal me pediu e eu comecei a fazer. A minha filha divulgou, as pessoas comeram, gostaram e assim começou”, conta.
Além do acarajé, abará e do caruru completo, da sua cozinha saem moquecas, bolos, pãozinho delícia e outras maravilhas gastronômicas que fazem a alegria não só dos baianos. “Não estou querendo me botar lá em cima não, mas os baianos que comem gostam e os canadenses também”. Mais informações sobre o menu de Nilza podem ser acessadas no perfil do Instagram @nilzita_gourmet.
Nerd e cozinheira
Desde 2018 vivendo em Toronto, Juliana Abreu Lima relembra que a paixão pelos estudos a fez convencer uma tia a se mudar para o Canadá e, em seguida, acolhê-la. “Eu era muito nerd na escola e, quando estudei a geografia do Canadá, fiquei apaixonada e convenci a minha tia que pretendia morar nos EUA a mudar para cá”.
Em 2009, Juliana, que também é natural de Salvador e cresceu entre os bairros da Graça, Bonocô e São Cristóvão, veio para o Canadá pela primeira vez, ficando até 2012, quando retornou ao Brasil. Seu regresso à América do Norte se deu seis anos depois.
Além de sabor, sua relação com a culinária baiana é recheada de afeto, respeito e identidade. Ela reconhece a origem africana do acarajé e o valor histórico desse quitute enquanto alimento de libertação. Ela conta que na época do Brasil Colônia, o bolinho era comercializado pelas mulheres negras libertas com o objetivo de comprar a alforria e libertar outros negros escravizados.
“O acarajé entra nesse lugar de me reinventar como pessoa e vejo que esse prato típico da Bahia pode abrir um caminho para, no futuro, me levar a ter uma vida mais tranquila aqui no Canadá”, disse. Atualmente, uma vez por mês, Juliana fornece acarajé para a Padaria Toronto. Ela divulga informações sobre os produtos no Instagram @acarajutoronto, onde também compartilha conteúdos sobre a história da África e suas curiosidades.
Hoje, tanto Juliana quanto Nilza não têm a culinária como atividade econômica principal. No entanto, ambas vislumbram em breve poder viver da cozinha e, quem sabe até, gerar emprego e renda para outras pessoas. “Às vezes eu não tenho como pegar mais pedidos. É complicado, mas vou me organizar para ter pessoas me ajudando e atender a demanda”, disse Nilza.
Ingredientes Baianos
Apesar de atualmente ser mais fácil encontrar feijão fradinho, dendê e outros ingredientes necessários às preparações, nem sempre foi assim. Nilza relembra que chegou a recorrer à Amazon para ter em mãos o dendê que hoje está disponível nos mercados africanos. Quiabo, camarão seco, castanha, amendoim e outras especiarias, felizmente, podem ser comprados em lojas de produtos brasileiros e de outras nações que dialogam com a culinária do país da América Latina.
Isso é acará?
Entre as curiosidades envolvendo a culinária baiana em Toronto, Juliana relembra que certa vez teve uma encomenda extraviada. Ao despachar o pacote com os acarajés, o entregador, que era nigeriano, reconheceu pelo cheiro o que tinha nas mãos. “Isso é acará?”, perguntou para confirmar a suspeita. Diante da resposta afirmativa, não deu outra: o pacote nunca chegou ao destinatário, mas certamente alegrou o dia de alguém.
Publicado originalmente no site Wave Your Canada