A Escola Maria Felipa, criada em Salvador, em 2018, chega ao Rio de Janeiro no dia 7 de dezembro, com o Festival Avante, aberto ao público. A primeira instituição de ensino afro-brasileira do Brasil tem projeto pedagógico antirracista, no qual os alunos têm acesso à história de povos e civilizações africanas e indígenas, pouco exploradas na grade curricular comum.
Na capital fluminense, a instituição, que leva o nome de uma heroína da Independência do Brasil na Bahia, fica em Vila Isabel, na Zona Norte da cidade, onde o festival acontecerá. A programação diversificada e afirmativa entrelaça arte, cultura, educação, gastronomia e empreendedorismo afro-indígena e contará com exposição e comercialização de produtos da economia criativa e do sagrado de afroeempreendoras.
A escola é para crianças de 2 a 11 anos, de todas as etnias, com turmas que vão do ensino infantil até o 5º ano do fundamental 1. As matrículas foram abertas no dia 19 de outubro e o primeiro matriculado na unidade do Rio foi Theo, de 2 anos, filho da psicóloga Mariana Magalhães. “O Theo é uma criança negra que veio para mim através da adoção. Quero que ele cresça num espaço em que se sinta seguro, valorizado, potente, que se reconheça no aprendizado e ame suas marcas fenotípicas, o cabelo, a cor da pele”, defende a mãe solo, que já conhecia a fundadora da escola, a baiana Bárbara Carine, e a seguia nas redes sociais.
Na Maria Felipa, a grade curricular segue todas as normas e diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Educação (MEC), mas vai além ao adotar uma proposta pedagógica que chamam de “ensino decolonial”, que apresenta de forma igualitária as culturas africana, indígena e europeia. Neste contexto, datas comemorativas que fazem referência à mitologia dos orixás, tributo a Marielle Franco, Dia de Pessoas Ícones da Abolição da Escravatura, além de festas indígenas, estão incluídas no calendário escolar.
“A estética, a religião e a história europeias estão fortemente presentes no currículo escolar e isso forma nossa subjetividade e cria referências sociais. A nossa escola não joga no lixo a história e a riqueza produzidas pela Europa, mas busca diversificar, trazendo diferentes culturas que formaram o povo brasileiro. O objetivo é mostrar a história em suas várias versões, da diáspora africana, dos povos indígenas, e valorizar nossa brasilidade”, explica Bárbara Carine, socióloga, escritora e fundadora da escola.
Ela teve a ideia de criar um espaço de ensino com esse propósito em 2017, a partir do nascimento de sua filha, que chegou por adoção. A socióloga se viu frustrada por não encontrar uma escola que valorizasse as raízes ancestrais afro-brasileiras. “Eu tinha muito conhecimento científico de coisas magníficas que não chegam às escolas. Eu achava isso muito triste. As crianças crescem ouvindo sobre a escravidão, ‘índios selvagens’, sem saber a riqueza e o pioneirismo das primeiras civilizações humanas que vieram da África, e a sabedoria e a ciência indígenas. Isso é muito cruel e contribui para a síndrome do vira-lata. Comecei a pensar em uma escola que desse outra referência, não só essa de subalternidade”, conta Bárbara.
“Achei muito potente uma escola totalmente antirracista. Depois de um tempo, a Bárbara começou a namorar um ator que trabalhou comigo no filme ‘Os Enforcados’ e, um dia, conversei com ele sobre a escola. Por coincidência, passamos o mesmo fim de ano em Salvador e marcamos um encontro. A Juju fez uma semana de intercâmbio e amou a escola. Foi muito fácil. E eu só pensando em como queria que tivesse uma no Rio”, lembra Leandra Leal sobre a filha Julia, hoje com 10 anos. A atriz e diretora faz parte do quadro de sócios da unidade do Rio, junto com Bárbara e Maju Passos.
A Maria Felipa é uma escola particular, com mensalidade a partir de R$ 2.090, com alimentação incluída. Do total de vagas, 20% serão de bolsas integrais para crianças negras e indígenas em situação de vulnerabilidade social, com renda familiar comprovada de até um salário-mínimo. A escola também vai abrir um edital de sorteio para bolsas de 50% para famílias com renda de até R$ 10 mil.
Em Salvador, a Maria Felipa fica no bairro do Garcia.