À frente da Lavagem de Madeleine, em Paris, o multiartista baiano Robertinho Chaves é o protagonista de “Madeleine à Paris”, de Liliane Mutti. Entre os selecionados da 48ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o filme, que apresenta o artista queer, andrógino, negro e de Candomblé, que há mais de duas décadas encanta a capital francesa com sua arte, terá três exibições durante o evento.
O olhar sensível da cineasta, que há seis anos acompanha os passos do santamarense, poderá ser visto na estreia da próxima quinta-feira (17), às 19h30, na sala 2 do Espaço Augusta e, em seguida, no dia 24, às 13h30, no Espaço Augusta (Anexo 4) e, no dia 26, às 17h10, no Cinesystem Frei Caneca (sala 3).
“Madeleine à Paris” mostra os desafios e conquistas de um imigrante latino na Europa, o sonho de um artista, os limites e as superações da vida. As raízes transculturais tecem a trama que conta a caminhada de Robertinho, entre luzes, plumas e paetês. A história desse personagem da vida real é mais do que um show, é um ato de resistência.
“Ver minha própria vida nesse filme foi emocionante, uma redescoberta. Revivi momentos do passado que me trouxeram até aqui. É muito gratificante ver as dificuldades e prazeres de tudo que passei, uma experiência mágica poder contar isso em um filme. Quando me vejo ali, vejo o artista que manifesta as culturas afro-brasileiras nas ruas de uma Paris nem sempre tão acolhedora com quem é diferente“, destaca Robertinho.
O artista é o idealizador da mais importante tradição afro-brasileira na Europa, a Lavagem de Madeleine. Há mais de duas décadas, o cortejo é símbolo da cultura brasileira na Europa. O desfile acontece há 23 anos em Paris, inspirado na Lavagem do Senhor do Bonfim, de Salvador, e abre o calendário do verão europeu. A festividade começa na Praça da República da capital francesa e vai até a Igreja da Madeleine, onde lavam-se as escadarias. A celebração reúne a cada ano cerca de 60 mil pessoas, seguindo o trio-elétrico puxado por Carlinhos Brown e Roberto Chaves. Franceses, brasileiras e brasileiros, pessoas de diferentes nacionalidades, misturam-se nas ruas parisienses, dançando ao ritmo dos atabaques e das músicas em Iorubá.
No longa, assistimos Robertinho como um orixá do cortejo da Lavagem e, à noite, sua outra faceta, com sua fantasia, maquiagem e performance de arlequim, no Cabaré Paradis Latin, onde começou a trabalhar há 33 anos. O artista circula entre o tradicional catolicismo francês e sua origem de Axé, do recôncavo baiano, de quem cresceu sob a guarda e bênção de Dona Canô, mãe de Caetano Veloso e Maria Bethânia. Entre uma edição da Lavagem e outra, ele viaja ao Brasil em busca de suas raízes familiares e espirituais. Suas vivências entre os dois países, entre o masculino e o feminino, o sagrado e o profano, fazem do filme um profundo mergulho em busca de identidade.
Único filme baiano dirigido por uma mulher na 48ª Mostra SP, “Madeleine à Paris” é um “road movie afro-queer entre Paris e Santo Amaro da Purificação, na Bahia”, como define Liliane Mutti, que coloca as duas cidades em diálogo. “Estamos muito felizes em estrear no Brasil nesse momento decisivo de São Paulo, quando a cidade está se ressignificando. E a escolha da mostra de colocar o filme em duas sessões na Augusta deixa a equipe do filme muito alegre. Sabemos que a alegria é revolucionária, como vocês vão poder ver com o personagem de Robertinho“, reflete a diretora, que já lançou a obra em Paris e em Bordeaux.
“Assistir a esse filme foi como uma sessão de magia. Ver a resistência de Robertinho na tela do cinema nos dá um presente de Paris e da Bahia para o mundo. E ainda tem a trilha sonora, que está de parabéns. Tem o Candomblé, tem o Babalorixá, tem o Terreiro de Santo, tem tambor e tem a nossa mistura, tem Chico Buarque e Baden Powell. A realizadora captou a alma musical e encantada de quem faz esse desfile: o povo brasileiro em Paris. Todo mundo precisa ver, vem pra cá pra ver Madeleine abençoar!”, celebrou Carlinhos Brown, peça cativa da festa.
O filme está previsto para chegar às telas dos cinemas brasileiros ainda em 2024.