Em Itapuã, Caruru de Cira do Acarajé segue firme por 85 anos graças aos orixás e às mulheres da família

Em Itapuã, Caruru de Cira do Acarajé segue firme por 85 anos graças aos orixás e às mulheres da família

Redação Alô Alô Bahia

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Maria Marques

Maria Marques/Alô Alô Bahia

Publicado em 24/09/2024 às 11:34 / Leia em 3 minutos

Do Órun, dona Jaciara de Jesus deve olhar com orgulho em direção à Rua do Tamarineiro, em Itapuã, na noite desta segunda-feira (23). Reconhecida mundialmente como Cira do Acarajé, e falecida em 2020, a quituteira deixou como missão para as filhas Juçara Santos e Cristina de Jesus, para a ex-nora Ana Paula, e demais familiares, a continuação do já ancestral caruru, servido religiosamente há 85 anos, em cortejo aos santos gêmeos São Cosme e Damião.

Juçara e Ana Paula são duas das mulheres que mantêm vivo o legado e o império deixado por Cira do Acarajé | Foto: Maria Marques/Alô Alô Bahia

Mulheres estão à frente da origem e da perpetuação do legado. Tudo começou em 1939, com a avó de Cira, Odete Brás de Jesus. “Foi uma promessa de minha bisavó para Cosme e Damião. A gente não sabe mais qual foi o voto, mas passou dela pra minha avó. Mainha começou a dar o caruru na mesma Rua Olhos d’Água, aqui em Itapuã, aos 13 anos, que foi quando ela ficou órfã, assumiu o tabuleiro e passou a criar os quatro irmãos mais novos”, narra Cristina.

Desde então, a notícia se espalha de boca a boca, “sem precisar de anúncio”, garante Juçara ao Alô Alô Bahia. Mais de mil itapuãzeiros e soteropolitanos de todos os cantos, e santos, se apinham na saga de garantir a sua quentinha. Da mansão onde dona Cira morava, não saem de barriga vazia. É um farto banquete para ninguém botar defeito.

Os preparativos se iniciam desde o primeiro dia de setembro até a presente data. De lá para cá, Ana Paula informa que são comprados incríveis 12 mil quiabos, 30 kg de cada feijão –fradinho, branco e preto–, 30kg de arroz, 30kg de farinha de mandioca e 250 kg de galinha, entre outros mantimentos, por R$ 30 mil, financiados pela própria família da baiana.

E ninguém ouse comer antes dos erês. Como governam os preceitos do Candomblé, são os sete meninos quem primeiro se deliciam, usando as mãos, enquanto cantigas para São Cosme e Damião são entoadas pelos mais velhos. Aí, sim, depois, os convidados são autorizados a se servirem e os panelaços repletos de quentinhas passam a ser distribuídos ao povo.

Como diz a mitologia do Candomblé, somente os Ibejis tinham o poder da cura e, por esse motivo, no Caruru de São Cosme e Damião sete meninos são convidados a comer utilizando as mãos, antes da comida ser servida aos adultos | Fotos: Maria Marques/Alô Alô Bahia

O ritual acontece na sala principal da mansão da família, enfeitada de balões multicoloridos e de toda sorte de guloseimas – que só são servidos no dia seguinte, nesta terça (24), a partir das 17h30. São 21 tortas e um bolo sem-tamanho de São Cosme e Damião, todos feitos por Cristina, rodeados por brigadeiros, casadinhos, camafeus de nozes, compotas de cocada-puxa, cocada normal, doces de tamarindo, de abacaxi e banana, balas, bombons, pirulitos…

E quem quiser que bula em doce de preceito antes da hora! “É impressionante como ninguém mexe, nem as crianças nem os adultos”, observa Mari Silva, uma das nativas de Itapuã que teve a honra de testemunhar pessoalmente a exuberância do evento, provavelmente um dos maiores carurus de Salvador.

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