Do improviso doméstico ao símbolo baiano: livro reconstrói a origem do Pão Delícia

Do improviso doméstico ao símbolo baiano: livro reconstrói a origem do Pão Delícia

Redação Alô Alô Bahia

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José Mion/Alô Alô Bahia

Cozinhando com Ly

Publicado em 01/12/2025 às 14:02 / Leia em 4 minutos

A aposentada Laila Eliazigi Abboud começou a ganhar fama no bairro depois de participar de um curso de culinária, onde aprendeu a base da receita que viria a transformar sua vida: o pão delícia. Segundo relatos da época, o sucesso foi tão grande que as vizinhas passaram a fazer encomendas. A produção cresceu de forma inesperada, forçando-a a criar uma marca com seu nome para fornecer os pãezinhos para os Supermercados Paes Mendonça.

Além da projeção comercial, um novo capítulo desse legado será celebrado no próximo dia 15 de dezembro, às 19h, no Palacete Tira Chapéu, com o lançamento do livro “A História por trás da criação do Pão Delícia”. A obra, escrita a partir da memória dos filhos e dedicada in memoriam a Dona Laila, busca reconduzir ao ponto de origem a trajetória da mulher que, segundo sua família, “criou e popularizou o pão mais amado da Bahia”.

O livro chega em sintonia com o debate cultural mais amplo: a Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) protocolou recentemente o Projeto de Lei 26.043/2025, que propõe declarar o Pão Delícia como bem cultural e imaterial da Bahia.

A narrativa aprofunda a vida de Laila, imigrante, empreendedora e mãe de sete filhos, e rememora o período em que ela transformou uma técnica aprendida em curso em uma marca afetiva da mesa baiana. “Foi assim que ela sustentou nossa família por mais de dez anos. Agora, tivemos coragem e maturidade para transformar saudade em livro”, afirma Paulo Abboud, um dos filhos. “Foram cinco anos de trabalho para revelar essa história como ela merece ser contada”, diz.

Livro é dedicado a Laila Abboud, que a família diz ser a criadora do pão delícia | Foto: Angeluci Figueiredo

A consolidação da história de Dona Laila, no entanto, convive com outra figura importante nesse imaginário culinário: a cozinheira Elibia Portela, frequentemente mencionada como possível autora da receita. Ela mesma reconhece o entrelaçamento de versões. “Não criei o primeiro, aqueles de aniversário. Criei novas massas, mais fáceis, que qualquer pessoa pode fazer”, afirmou em entrevista ao iBahia, em 2016.

O que importa é que todas as versões situam o surgimento do prato na Bahia. A história mais difundida atribui o nascimento do pão a um erro doméstico: uma massa mole e pegajosa, esquecida para levedar e assada às pressas, que resultou no pão macio coberto com manteiga e queijo. Elíbia ensina e aperfeiçoa o preparo há mais de 50 anos e, em seu livro “Panificação Caseira nº 2”, ela afirma que o pão teria surgido justamente desse acidente ocorrido na infância, quando improvisou uma massa mais mole após a mãe, banqueteira, ficar sem a farinha especial necessária. Depois de tentativas frustradas, a terceira fornada deu certo e a receita familiar acabou se tornando um dos itens mais populares das festas baianas.

A coexistência dessas memórias, uma familiar, outra popularizada em cozinhas profissionais, revela como o Pão Delícia ultrapassou o universo doméstico e se tornou um capítulo vivo da cultura baiana. Desde os anos 1970, a receita atravessa gerações e fronteiras, marcando celebrações, padarias, festas infantis e cardápios afetivos de baianos, brasileiros e turistas.

O lançamento da obra sobre Dona Laila reforça esse movimento de valorização cultural. O evento, reservado a convidados, marcará não só a apresentação do livro como também uma degustação da receita original e de pratos que remetem à herança libanesa da família.

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