Brinquedos antigos ganham nova vida e aquecem o mercado. Saiba onde conseguir aquele Ferrorama antigo

Brinquedos antigos ganham nova vida  e aquecem o mercado. Saiba onde conseguir aquele Ferrorama antigo

Redação Alô Alô Bahia

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Moysés Suzart para CORREIO

Moysés Suzart/CORREIO

Publicado em 19/10/2025 às 13:09 / Leia em 8 minutos

No meio de tantos cacarecos, diversos brinquedos antigos descansam na loja de antiguidades localizada na Rua Ruy Barbosa, no Centro Histórico de Salvador. Parecem brinquedos do Toy Story, aguardando uma nova criança para brincar com eles. Contudo, acontece que a lógica deste clássico da Disney/Pixar está mudando. Quem mais leva as peças antigas não são meninos ou meninas, mas adultos que buscam a nostalgia de relembrar seu passado através de uma Barbie, um Comandos em Ação, o Baby Sauro ou um Ferrorama. Brinquedos que os pais não tinham grana para presenteá-los, mas agora eles próprios podem comprar. Neste mundo da tecnologia, a geração millennial está voltando ao passado e aquecendo o mercado dos brinquedos vintage.

A tendência tem nome de mercado e alma de sentimento: kidult, uma mistura de criança (kids) com adultos (adult). Resumindo: são adultos que voltam a consumir brinquedos, movidos pela nostalgia, pent-up demand (demanda reprimida) de quem não pôde ter certos itens na infância e por uma indústria que percebeu a oportunidade de “vender o passado como produto”. Esse fenômeno está em crescimento e pesquisas de 2024 revelaram algo inédito: hoje, adultos compram mais brinquedos do que crianças. E não é para dar de presente aos pequenos, não.

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A Circana, consultora norte-americana sobre comportamento do consumidor, fez uma pesquisa mostrando que, pela primeira vez na história, adultos acima dos 20 anos superaram a faixa etária de 3 a 10 anos na compra de brinquedos para uso próprio. Ainda de acordo com o estudo, os millennials se destacam nesse movimento, principalmente por adquirir produtos de marcas antigas, sobretudo dos anos 80 e 90. Mas, nem precisa ir aos Estados Unidos para constatar isso.

“Nunca entrou criança aqui para comprar brinquedo. Só entra adulto, que chega a chorar quando vê um He-Man, uma Barbie ou um Playmobil. Um cara aqui pagou R$ 800 num Ferrorama que ele sempre quis ter e acho que pagaria mais se eu pedisse. Uma senhora viu uma pipoqueira da Estrela aqui e pagou R$ 250. Disse que vinha pegar depois, mas nem veio ainda. Preciso até tirar dali, pois toda hora uma pessoa chega perguntando quanto é. A entrada e saída de brinquedos dos anos 80 é muito forte. É o que mais vendo na minha loja”, assegura Gildo Fortunato, dono da GG Antiguidades, no Centro Histórico.

Para muita gente nascida entre o fim dos anos 1970 e o começo dos 1990, a chamada geração millennial, esses objetos não são apenas objetos: são atalhos para memórias, sentimento de conforto e identidade. Nos últimos anos, a procura por brinquedos antigos cresceu e criou um mercado vibrante de colecionadores ou compradores casuais que pagam desde dezenas de reais por um boneco usado até milhares por peças raras e lacradas. E dá para lucrar com isso também. Na loja de Gildo, um Comandos em Ação Flecha Veloz, de 1989, está custando cerca de R$ 60 reais com ele, em ótimas condições. No Mercado Livre, este mesmo boneco custa R$ 600.

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Nos antiquários de Salvador, é possível dar uma garimpada para encontrar aquele brinquedo que marcou a infância ou para buscar algo que possa ser revendido. Quando visitamos Gildo Fortunato, ele tinha diversos itens colecionáveis. Quanto mais conservado, maior o valor. O Baby Sauro, que foi febre nos anos 90, por causa da série televisiva, e chegou a ser o brinquedo mais vendido em 1992, esgotando no estoque das lojas, está no acervo de Gildo por R$ 200. “Tem conversa, sempre negocio. Outro que toda hora entra aqui é o boneco do Fofão, que vende feito água. O povo compra pela lenda urbana de ter um punhal dentro”, conta.

Dá para caminhar em outros antiquários e achar peças ainda mais raras. Ademário Olímpio, que tem uma loja próxima à de Gildo, tem bonecas dos anos 40, 50, 60… Todas de porcelana e dentro da caixa. Algumas nem foram comercializadas no Brasil. Estas podem custar mais de R$ 3 mil, a depender do modelo.

Há motivos práticos e emocionais para o fenômeno kidult. Psicólogos e pesquisadores indicam que a nostalgia pode melhorar o bem-estar emocional: rememorar memórias positivas reforçar o sentimento de pertencimento, reduzir a solidão momentânea e ajudar a regular o humor.

Em um mundo acelerado, ter contato com um brinquedo da infância pode funcionar como um “antídoto” temporário ao estresse, além da fuga de um mundo meramente virtual. É um ato que muitos descrevem como reconexão com uma versão mais simples da vida. Estudos científicos mostram efeitos positivos da nostalgia sobre o humor e a gratidão, ainda que seus efeitos a longo prazo variem conforme o contexto.

Além da busca por conforto, há um componente social. Colecionar virou hobby que une uma verdadeira comunidade. Feiras, grupos em redes sociais, fóruns e encontros reúnem apaixonados que trocam itens, consertam bonecos e celebram a memória coletiva. Para alguns, há também o fator especulativo. Certas peças raras mantêm ou aumentam valor no mercado de colecionáveis.

Algumas marcas concentram demanda consistente: Mattel (Barbie, Hot Wheels), Hasbro (G.I. Joe/Comandos em Ação, Transformers), Bandai (Tamagotchi, animes), Kenner (Star Wars vintage), além de marcas nacionais como Estrela e Mimo. Em coleções temáticas (por exemplo, itens licenciados de filmes ou desenhos cult), a procedência e a caixa original aumentam muito o valor de mercado. Com o aumento do consumo entre os 40+, empresas de brinquedos voltaram a fabricar itens que até então estavam fora de linha para abocanhar este nicho no mercado. E está dando certo.

Uma pesquisa da Abrin, a maior feira de brinquedos da América Latina, mostra que o segmento de colecionáveis e jogos de tabuleiro voltados para adultos estão dando lucros e em franca expansão. No Brasil, ainda segundo o estudo, 76% dos adultos entre 18 e 65 anos se consideram consumidores potenciais desse segmento – a média mundial é de 67%.

Sobre os usados, peças originais de época, o garimpo é fundamental, principalmente, se for no universo online. O leque é grande: itens comuns e usados aparecem entre R$ 50 e 300 na OLX e Mercado Livre. Alguns são vendidos em lotes equivalentes, como o de 30 bonecos tipo Playmobil Pirata, por exemplo. Conjuntos completos e peças em caixa podem subir para até R$ 3 mil. Peças raras, leilões internacionais e edições limitadas ultrapassam esses valores com facilidade. Barbies vintage muito raras já alcançaram milhares de dólares em casas de leilão.

Tamagotchis originais, os primeiros bichinhos virtuais vendidos, podem variar de 20 a mais de mil dólares, dependendo do modelo e do estado de conservação. No Brasil, coleções inteiras de Comandos em Ação já são ofertadas por valores na casa dos milhares. Lojas brasileiras especializadas mostram action figures cotadas entre R$ 200 e R$ 550, conforme a peça.

O mercado de colecionáveis também tem riscos de falsificação. Para peças de alto valor, prefira vendedores com boa reputação ou autenticação profissional. E sempre converse, tire todas suas dúvidas, antes de comprar. Uma pergunta nunca pode faltar: é original de época, ou é um remake?

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Faz bem?

Colecionar é, em essência, uma atividade com potenciais benefícios sociais e emocionais. Cria redes de amizade, promove passatempo criativo e, segundo pesquisas, pode contribuir para bem-estar por meio de memória positiva e sentimento de continuidade de identidade. Em termos psicológicos, a nostalgia pode reforçar suporte social e sentido de pertencimento.

Mas, como qualquer hobby, colecionar pode ter um lado prejudicial quando se torna compulsivo: gastos desproporcionais, acúmulo que atrapalha a vida financeira e provoca conflitos familiares. Especialistas em saúde mental e finanças pessoais recomendam regras simples: definir orçamento para hobby, priorizar armazenamento adequado (evitar mofo e danos) e balancear o tempo gasto com outras responsabilidades. Se o colecionismo vira fonte de estresse ou dívida, vale buscar orientação profissional.

O mercado dos kidults mostra como a linha entre nostalgia e consumo se tornou um espaço fértil para negócios e afetos. O que começou como curiosidade de colecionadores se consolidou como um nicho em expansão, com impacto direto no mercado e na cultura pop.

Por trás das vitrines e dos leilões online, há histórias de infância, reencontros e desejos reprimidos. Saí da loja de antiguidades de Gildo com cinco Comandos em Ação, todos que eu tinha quando era uma criança nos anos 80. Estou apaixonado por eles, abro a caixinha só para ficar olhando. Contudo, o que mais chamou atenção foi outra coisa: peguei meu filho de 11 anos brincando com eles, esquecendo um pouquinho o celular. Valeu a pena.

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