Orixá dos mares e única figura afrodiaspórica a ter uma festa popular em sua homenagem, a imagem de Iemanjá foi restaurada para a festa deste ano, no tradicional 2 de fevereiro. Nesta quinta-feira (30), a prefeitura de Salvador e a Fundação Gregório de Mattos (FGM) anunciaram a restauração da imagem da divindade, localizada em frente à Colônia de Pesca Z1, no bairro do Rio Vermelho.
O restaurador José Dirson Argolo, responsável pelo projeto de restauração da escultura, afirmou que a ideia era retornar às características originais da obra, concebida pelo artista Manoel Bonfim há 56 anos.
“O monumento havia sido adulterado nos últimos anos por pessoas leigas. Por exemplo, esse pedestal de cerca de 600 búzios estava escondido por argamassas e pinturas. Precisamos usar bisturis cirúrgicos para conseguir recuperá-lo. No caso de Iemanjá, havia várias camadas de tinta que foram removidas, também por bisturis cirúrgicos. É o mais próximo possível da obra original”, explicou ele.
Apesar da intenção de restituir a escultura original, José Argolo disse que manteve adornos e adereços colocados por devotos ao longo dos anos. “Eu tinha uma grande amizade com Manoel. Fui professor dos filhos dele, que também são artistas plásticos. É muito emocionante retribuir aos moradores do Rio Vermelho e aos devotos de Iemanjá a recuperação das características originais da escultura”, afirmou.
Patrimônio imaterial de Salvador desde 2020, a Festa de Iemanjá possui grande importância no combate ao preconceito contra a cultura afro. É o que pontuou o diretor de Patrimônio e Espaços Públicos da FGM, Chicco Assis, reiterando a importância de dar um passo adiante na preservação dos monumentos e da manifestação popular. Ele utiliza como exemplo o plano de salvaguarda, elaborado ano passado junto aos pescadores.
“Quando a gente fala de patrimônio imaterial, nós estamos falando de pessoas. Um plano de salvaguarda é utilizado para criar uma série de ações para preservar e divulgar os bens. Somente a patrimonialização não consegue dar o valor devido a história e cultura de uma festa como a de Iemanjá. Ela [a festa] mostra como a cultura afro-brasileira contribui para a identidade do soteropolitano”, disse Chicco.
Barcos reformados
Na cerimônia, que teve intervenções artísticas das Filhas de Gandhy, Chicco também anunciou a requalificação de seis barcos usados pelos pescadores da Colônia de Pesca Z1. A iniciativa é realizada pela FGM, através do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Até o momento, três embarcações já tiveram as reformas concretizadas, enquanto a outra metade passará pelo mesmo processo após a Festa de Iemanjá.
Presidente da Z1, Nilo Garrido revelou empolgação com o evento deste ano, mas destacou a dificuldade de realizar a festa no final de semana. “Esse ano, como vai acontecer domingo, vai ter muito mais gente que o normal. Vai ser mais trabalhoso para a gente que está organizando, mas também vai ser mais gratificante. O preço para reformar os barcos ia ser muito caro para os pescadores”, declarou.
O evento também contou com o projeto “Patrimônio é…”, uma roda de conversa educativa da FGM. Nesta edição, a jornalista Cleidiana Ramos e a doutora em Sociedade e Cultura Cecília Queiroz conversaram sobre a origem e o papel dos pescadores para a Festa de Iemanjá. Para as convidadas, o evento ocorre por conta da devoção dos pescadores, sendo uma festa da comunidade em que o resto da cidade também é convidado.
“A festa iniciou na década de 1920, em que os pescadores passaram por uma escassez de peixes e fizeram uma homenagem para a Rainha do Mar. No início, o principal local de adoração a Iemanjá era em Monte Serrat, mas o Rio Vermelho foi tomando esse protagonismo com o tempo”, explicou Cleidiana.